sábado, 6 de abril de 2024

Porque Há Filhos Bandidos em Famílias Crentes?

Por João Cruzué 

Por que há filhos de crentes no meio da bandidagem e no tráfico de drogas? Aí está uma questão de resposta aparentemente fácil. Quem é que ainda não ouviu: "a boa parte dos nomes de presidiários brasileiros são nomes bíblicos. Afinal por que isso acontece? Será por falta de cuidados? tempo excessivo gasto na Igreja e negligência no cuidado dos pequenos? A primeira vista pode parecer um assunto de fácil dedução, mas eu descobri que não.

Uma das ilações mais ouvidas hoje  é: "A culpa é das mães dessas crianças que ficam orando em demasia dentro das Igrejas, enquanto seus filhos estão com más companhias do lado de fora. Excesso de oração e falta de acompanhamento do que eles fazem. Será?

Dona Nilza é mãe de D...., o braço direito do chefe de tráfico no Rio. Foi ela, uma senhora evangélica que junto com o filho pastor e alguns amigos crentes, convenceram o jovem a se entregar ao delegado do 6º DP., Dr. Luiz A. C. de Andrade.

O eletricista Ivanildo, evangélico de 55 anos, também seguiu o exemplo de Dona Nilza e levou o filho C. A.  a se entregar à Polícia carioca. Também há uns dois anos, o padrasto daquele garoto que roubou o carro de uma senhora e arrastou o filhinho dela preso na porta do carro por alguns quilômetros - também era evangélico. Não há, portanto, nenhum segredo em dizer que há mesmo muitos filhos de crentes envolvidos na vida criminosa.

Para os que tenta explicar de uma maneira fácil esta questão, vamos ao seguinte fato: Deus criou o primeiro Casal: Adão e Eva, e eles geraram Caim e Abel. Caim foi o primeiro criminoso sobre a terra, segundo o que se lê nas Sagradas Escrituras. Onde foi que Adão e Eva erraram? Eles oravam demais? Iam a Igreja? Não tinham tempo para conversar com os filhos? Eram pessoas muito ocupadas? Para todas estas perguntas, eu creio que as respostas sejam a mesma: não!

Esaú, o filho gêmeo de Isaque e Rebeca, planejou a morte do irmão que lhe passou a perna no caso da bênção da primogenitura. O resultado foi que jurou de morte o irmão esperto: Jacob. Só não chegou a matá-lo, porque Deus interveio.

José, o primeiro filho de Jacob com Raquel, sofreu muito na mão dos irmãos. Foi amarrado, jogado num poço, vendido como escravo, acusado injustamente por uma mulher adúltera, preso, esquecido na prisão - e apesar de tudo isto, não se tornou um criminoso.

O Rei Davi, o homem que tinha um coração segundo Deus, foi o maior Rei sobre a nação de Israel. Um de seus filhos praticou um incesto com a irmã, outro filho vingou o incesto matando o irmão, e mais tarde se voltou contra o pai e tentou matá-lo, seguindo conselhos malignos.

O que estes fatos têm em comum? A contaminação da raça humana pelo pecado. Ele espreita bem de perto, principalmente as famílias dos crentes, para destruir, envergonhar, escandalizar e manchar de vergonha qualquer família cristã. Contra isso é preciso orações, jejum e muita conversa ao pé do ouvido dos filhos.

Não quero dizer com isso que a maioria dos casos de bandidagem entre filhos de crentes está a falta de coragem dos pais em confrontá-los, fingindo que são bons meninos. Conheci um grande pastor perdeu três filhos assassinados. Todos eles envolvidos de alguma forma com más companhias. Estar atento ao que acontece com os filhos é o grande dever dos pais. 

Conheço também um caso bem sucedido. Pai e mãe cristãos trabalhavam de segunda à sábado. Os filhos ficavam com a avó e também na rua perambulando com outras crianças. Quando o pai descobriu que um desles, com apenas quatro anos pegava o ônibus do bairro para ir roubar brinquedos em outro de grande comércio - ficou horrorizado. Tratou de mudar da Capital para um lugar bem longe, longe destas companhias. Sua drástica atitude evitou que aquele menino se tornasse um criminoso mais tarde.

Por que há filhos de pais crentes que envolvidos no tráfico de drogas e na bandidagem? Há várias e possíveis explicações. E nenhuma delas seria suficiente para explicar 100% o fato. Há um fator no Brasil que não é intrínseco aos pais que traz grande dor de cabeça: nenhum adolescente pode trabalhar antes dos 16 e 18 anos. Eu pergunto: é fácil para um jovem de 18 anos aprender a trabalhar já quase adulto? É corretíssima a Lei que dispõe sobre a obrigação dos pais matricularem seus filhos na escola e mantê-los apenas estudando até os 18 anos. Por acaso os criminosos respeitam esta lei? Não, não respeitam. Eles exploram as necessidades destes adolescentes, geralmente sem dinheiro algum no bolso, para conduzi-los ao mau passo. O governo não deixa, mas há emprego "garantido" no tráfico para os filhos dos mais pobres.

A conclusão a que chego é que em alguns casos a falha está na falta de amor dos próprios pais em pensar que amar é somente passar a mão na cabeça dos filhos e fingir que não veem, nem confrontam seus mal-feitos. Em outros casos, há pais de conduta irrepreensível que possuem filhos criminosos. Uma atitude eu não posso negar: Deus confrontou Caim; os irmãos de José foram confrontados com suas próprias consciências quando estiveram em apuros no Egito; Deus impediu o intento criminoso de Esaú quanto à Jacoó. Davi só não perdeu a família toda para o diabo, porque se arrependeu e era um homem de oração. E, por fim há um caso de grande exemplo na Bíblia para os pais que estão passando pela angústia de ter filhos criminosos: o Pai do filho pródigo. Se ele não fosse um pai amoroso nem tivesse um coração perdoador, seu filho caçula teria sido mal recebido e teria feito meia volta e fatalmente seria um criminoso.

Sempre houve e sempre haverá criminosos no meio de famílias decentes e honradas, como também no meio de famílias de cultura criminosa pode ter filhos que são corretos e trabalhadores. O que não pode acontecer é negar o perdão e um abraço amoroso para quem deseja recomeçar, nem deixar o filho morrer no crime sem confrontá-lo e aconselhá-lo a acertar as contas com a justiça. É uma situação muito difícil, que somente a misericórdia de Deus pode ajudar. O que não pode se esquecido é que os filhos são herança de Deus aos pais e que esta herança pode ser um suplício por uma falha de atitude dos pais: ou falta de oração, ou falta de encaminhar seus pequenos para a Casa de Deus, ou falta de amor por não corrigi-los antes que o diabo os leve à destruição. Que Deus nos guarde e aos nossos filhos também.

Fonte: Olhar Cristao

sábado, 30 de março de 2024

O SIGNIFICADO DA CEIA DO SENHOR

Por Pr Silas Figueira

Texto base: 1 Coríntios 11.23-34

INTRODUÇÃO

As igrejas evangélicas reconhecem duas ordenanças estabelecidas por Jesus Cristo e que devem ser observadas por seu povo: o batismo e a Ceia do Senhor. Sendo que o batismo representa a nova vida que alcançamos em Cristo, a ceia simboliza a morte do Senhor. 

O apóstolo Paulo, nesta Primeira Carta aos Coríntios, tratou de maneira objetiva sobre a Ceia do Senhor. Ela foi instituída pelo próprio Jesus na noite em que foi traído. Na sexta-feira, chamada pelos católicos de “sexta-feira da Paixão”. Nessa noite o Senhor foi preso e se deu por nós na cruz do calvário; mas no domingo de Páscoa o nosso Senhor ressuscitou.

Somente aqueles que foram remidos e lavados no sangue do Cordeiro e confessam o nome do Senhor Jesus devem participar desse banquete da graça. Só aqueles que discernem o que Cristo fez na cruz são chamados para participar desse memorial. A Ceia está centralizada na morte expiatória de Cristo e no Seu sacrifício vicário. A cruz de Cristo e não o egoísmo humano está no centro dessa celebração. O sangue de Cristo é o selo da nova aliança. Por meio dele Deus perdoa os nossos pecados e nos salva da ira vindoura [1].

Nesse texto nós encontramos ensinamentos do seu verdadeiro significado.

1 – O QUE PAULO NOS FALA A RESPEITO DA CEIA (1Co 11.23-26).

O apóstolo Paulo nesse texto ensina a igreja de Corinto o verdadeiro sentido da ceia, e mostra que a ceia é mais que um momento de comunhão, ele mostra que a ceia é um momento de celebração, pois o nosso Senhor não ficou no sepulcro, mas ressuscitou dentre os mortos e vive para todo o sempre. Leon Morris diz que é praticamente certo que esta epístola foi escrita antes de qualquer dos evangelhos, o que significa que este é o mais antigo relato que temos da instituição da Santa Comunhão [2].

Esse texto nos ensina algumas lições:

1º - Paulo mostra que a ceia é uma revelação (1Co 11.23a). Paulo deixa claro que o que ele está ensinando não é a sua própria opinião, mas Palavra revelada de Deus. Não é um ensinamento humano, mas uma ordenação divina. Jesus na noite em que foi traído deixou essa ordenança (Lc 22.17-20).

Alguns intérpretes acreditam que o apóstolo Paulo recebeu essa revelação diretamente do Senhor e não através dos outros apóstolos (cf. Gl 1.11,12). No entanto, a maioria dos intérpretes entende que Paulo quis dizer que a ceia faz parte das tradições da igreja e que essas tradições eram firmemente cridas como algo dado pelo próprio Senhor Jesus; e então Paulo, na qualidade de apóstolo de Cristo, expressou essas tradições com a sua autoridade apostólica [3].

Mas quanto a isso pouco nos importa, pois uma coisa nós sabemos, essa palavra procede de Deus para nós. O apóstolo recebeu do Senhor e nos ensinou o que havia recebido dele, seja direta ou indiretamente. Isso nos basta. 

2º - Paulo mostra que a ceia é um convite à comunhão com Cristo (1Co 11.23b). “Na noite em que foi traído”. Nessa noite o Senhor Jesus estava reunido com seus apóstolos em comunhão com eles. Por isso, nós precisamos entender que quando comemos o pão e bebemos o cálice, o Senhor está nos convidando à sua mesa. Ele está nos chamando a comunhão com ele e com nossos irmãos. Se os cristãos participam sem amar seus irmãos, os membros da igreja, eles estão desonrando o próprio Senhor. Por essa razão, precisamos aprender as palavras ditas pelo Senhor quando instituiu sua Ceia [4].

Na noite em que foi traído o Senhor proclamou algo tremendo para todos nós, a Sua salvação. Mesmo sabendo que Judas iria traí-lo, que Pedro iria negá-lo, que os apóstolos fugiriam, o Senhor Jesus não deixou de amá-los. Mesmo sabendo de tudo isso, a Nova Aliança foi estabelecida e a velha Aliança foi rompida. Como Jesus mesmo disse: “Ninguém tem maior amor do que este, de dar alguém a sua vida pelos seus amigos” (Jo 15.13).

3º - Paulo mostra que a ceia é um momento de darmos graças (1Co 11.24a). E tendo dado graças. É do termo grego que Paulo usou aqui, “eucharistesas”, que se deriva nossa palavra “eucaristia”, a qual se tornou um termo técnico para indicar a Ceia do Senhor [5]. Jesus deu “graças” mesmo sabendo do que estava por vir. A algumas horas da sua morte na rude cruz, o Senhor deu graças. Jesus fez uma oração de ação de graças, à mesa. Quando Jesus vê toda a realidade de sua paixão e morte diante de si, ele agradece. Não é lamento nem tampouco pesar pela despedida que preenchem seu coração, e sim a gratidão [6]. Sermos gratos a Deus em todo o tempo é uma lição que aprendemos aqui.

4º - Paulo mostra que os elementos da ceia são símbolos do sacrifício de Cristo (1Co 11.24,25). O pão simboliza o corpo do Senhor que foi pendurado na cruz calvário, e o cálice o sangue de Cristo, a nova aliança que estava sendo inaugurada. Em seu corpo pendurado na cruz, Jesus levou sobre si os nossos pecados e o seu sangue derramado nos purifica de todo pecado (1Jo 1.7). A velha aliança estava sendo quebrada e a nova aliança estava começando. Jesus era o nosso Cordeira Pascal que foi entregue na cruz para nos reconciliar para sempre com o Pai.

“Este cálice é o novo testamento do meu sangue”. Essa expressão dá à palavra sangue um sentido espiritual mais profundo. O cálice representa a nova aliança que Jesus ratifica com seu sangue. Quando Moisés confirmou o primeiro pacto no Monte Sinai, ele aspergiu sangue sobre o povo e disse: “Este é o sangue da aliança que o Senhor fez com vocês” (Êx 24.8; ver também Zc 9.11). Sangue animal foi aspergido para o primeiro pacto. O sangue de Cristo, para o novo pacto [7].

Este sacrifício estava sendo realizado por você e por mim: “Tomai, comei; isto é o meu corpo que é partido por vós”. “Este cálice é o novo testamento do meu sangue”. Jesus deu o seu corpo, toda a sua vida encarnada, por nós que cremos nEle.

Existem quatro maneiras de interpretar a ceia, principalmente os seus elementos – o pão e o vinho. Nós temos quatro interpretações:

1) TRANSUBSTANCIAÇÃO – É a ideia de que os elementos, pão e vinho, mudam de substância e se transformam em carne e sangue de Cristo na hora da consagração dos elementos. É a posição do Catolicismo Romano.

2) CONSUBSTANCIAÇÃO – É a posição de Lutero. É a ideia de que Cristo está presente fisicamente nos elementos pão e vinho. Conhecida também como empanação.

3) MEMORIAL – É a posição de Zwuinglio. É a ideia de que a Ceia é a apenas um memorial, ou seja, uma recordação da morte de Cristo – Igreja Batista.

4) MEIO DE GRAÇA – É a ideia de que Cristo está presente espiritualmente na Ceia, como alimento para nossa alma. Esta é a posição da Igreja Presbiteriana.

Temos também três tipos de ceia: a restrita – somente para os crentes em Jesus. A ultra restrita – somente para os membros daquela denominação ou somente para os membros daquela igreja. E a ceia livre – todos os presentes podem participar, independentemente de serem crentes em Jesus ou não. 

5º - Paulo mostra que a ceia deve ser realizada até a vinda do Senhor (1Co 11.26c). A Ceia do Senhor foi instituída para que a igreja pudesse recordar continuamente o sacrifício vicário de Cristo na cruz em seu favor. Todas as vezes que celebramos a Ceia do Senhor, estamos proclamando que o corpo de Cristo foi partido (pendurado na cruz), e dado por nós e seu sangue foi vertido como símbolo da nova aliança, sangue este que nos purifica de todo o pecado. A morte de Cristo é o eixo central do evangelho. Fomos reconciliados com Deus pela morte de Cristo. É pela sua morte que temos vida. Devemos anunciar a sua morte até que ele venha em glória.

João Calvino diz que a Ceia foi instituída com este propósito, a saber: para que Cristo nos lembre do benefício de sua morte, e nós, de nossa parte, possamos reconhecê-la diante dos homens [8]. Por isso, não participar da Ceia do Senhor é desobediência e um pecado visto que a ceia é uma ordenança.

2 – OS PERIGOS EM RELAÇÃO À CEIA DO SENHOR (1Co 11.27-32).

Apesar de cremos que a ceia seja um memorial, nem por isso deve-se participar dela de forma indigna. Jesus se faz presente em nossas vidas e no culto que celebramos a Ele. Por isso, não devemos negligenciar as ordenanças bíblicas e as orientações que Paulo dá em relação a ceia.

1ª – Em primeiro lugar, não devemos participar indignamente (1Co 11.27). Leon Morris diz que ninguém jamais pode se considerar digno da bondade de Cristo para conosco [9]. Aquele que pensa que é digno da bondade de Cristo não entendeu o seu estado pecaminoso. Não entendeu que foi devido ao seu pecado que Jesus morreu na cruz. Mas há um segundo problema, é achar que nunca é digno de participar da ceia. Quem pensa assim também não entendeu que a razão de participarmos dela, que é exatamente porque Jesus já pagou um alto preço por nós e, devido a isso, somos dignos de estar participando de sua mesa.

Participar indignamente deve ser entendido segundo o contexto de 1Co 11.17-22. Paulo quis dizer que a decência comum deve ser observada; não pode haver qualquer das desordens de glutonaria, de embriaguez, de egoísmo, de degradação a outros, de contendas entre os crentes, de grupos facciosos, etc., todas essas práticas atuavam como elementos perturbadores da igreja de Corinto, que profanavam sua observância da Ceia do Senhor [10]. Participar da Ceia indignamente é assentar-se à mesa de forma leviana e irrefletida.

Participar da ceia do Senhor indignamente é não entender o que Jesus fez por nós na cruz. É não entender o significado do pão e do cálice. É não perceber que aquele pedaço de pão representa o corpo do nosso Senhor que foi pendurado no madeiro por nós, levando sobre si os nossos pecados. Ele se fez maldito em nosso lugar (Gl 3.13; Cl 2.14). É não entender que o cálice representa o seu sangue inocente que foi derramado para nos purificar de todo o pecado. Éramos escravos do pecado, mas mediante o seu sangue fomos libertos.

Um exemplo do que estamos falando, quando alguém pisa ou queima a bandeira do nosso país, essa pessoa não está desonrando um pedaço de pano, mas está desonrando o país que ela representa. E caso você não saiba, isso é crime. Quando participamos da ceia indignamente estamos desonrando o nosso Salvador. E isso é pecado. 

2º - Em segundo lugar, as consequências de participarmos da ceia indignamente (1Co 11.27-30). Participar da ceia não nos trará nenhuma bênção especial. Não seremos mais santos ou iremos alcançar a salvação por causa disso. Os que participam da ceia já estão debaixo da bênção do Senhor (Ef 1.3). No entanto, se participarmos dela de forma indigna traremos castigo para nossas vidas. O apóstolo Paulo enumera algumas dessas consequências.

1 – Será culpado do corpo e do sangue do Senhor (1Co 11.27c). A versão ARA traz a palavra réu. Em outras palavras, “será culpado de”, presumivelmente como participante na causa da morte de Cristo, ou antes, “será culpado de profanar o corpo”, etc. Isso torna o indivíduo culpado de “violar” ou de “pecar contra” o corpo e o sangue de Cristo [11]. Ser réu do corpo e do sangue de Cristo Jesus é um pecado gravíssimo.  Você só tem dois lados para estar em relação ao sangue. Você está debaixo dos benefícios do sangue ou está do lado daqueles que levaram Jesus para a cruz e o mataram. Você é assassino de Cristo ou é beneficiário do sangue de Cristo. Participar indignamente da Ceia e ser réu do corpo e do sangue de Cristo; é estar na mesma posição de Anás, Caifás, Pilatos e os soldados romanos que pregaram Jesus na cruz. Assim, existem duas possibilidades: Você está debaixo dos benefícios do sangue de Cristo ou é réu do corpo e do sangue do Senhor [12]. David Prior diz que quando Paulo fala de alguém que come o pão e bebe o cálice indignamente, tornando-se réu do corpo e do sangue de Cristo, ele está dizendo que nos tornamos culpados de derramar o sangue de Cristo; isto é, nos colocamos, não do lado dos que estão participando dos benefícios de sua paixão, mas do lado dos que foram culpados por sua crucificação [13].

2 – Come para sua própria condenação (1Co 11.29,30). A versão ARA diz que come e bebe juízo para si. Uma pessoa que participa da ceia sem discernir a sua forma correta come e bebe juízo para si mesmo. A palavra grega aqui usada para juízo ou condenação é krima, aqui tem a ideia de castigo para o crente em Jesus, não de condenação eterna (Rm 8.1), é uma correção pedagógica. Há uma grande diferença no uso da palavra condenação que Paulo usa no v. 29, aqui ele usa a palavra krima no grego (julgamento) e katakrima (condenado) no versículo v. 32. A palavra krima refere-se a disciplina dos salvos e katakrima refere-se à condenação dos perdidos (para não sermos condenados com o mundo).

O versículo 30 nos fala de punições temporais e não eternas. Punições que vem sobre a vida do crente que é leviano em relação a ceia. Naturalmente, Paulo não quis dar a entender que “todas as enfermidades” são motivadas por algum pecado, porquanto ele mesmo sofria de um “espinho na carne”, tendo recebido a revelação que esse espinho lhe fora dado a fim de conservá-lo humilde, para que pudesse aprender melhor a confiar na graça de Deus em favor dele (2Co 12.7). Na verdade, a enfermidade física pode ter certo efeito disciplinador (Hb 12.5-7). E essa disciplina não significa necessária e especificamente que ela tenha sido motivada por algum pecado cometido [14].

João Calvino diz que não se pode afirmar se nesse tempo alguma praga os atormentava, ou se eram afligidos por outros gêneros de enfermidades. Seja como for, deduzimos do que Paulo diz que o Senhor havia enviado algum tipo de açoite para discipliná-los [15]. Paulo enumera três as punições que vieram sobre a igreja de Corinto: fraqueza, doença e morte física. Werner de Boor diz que pelo fato de que na celebração indigna da ceia se trata de comer e beber, a culpa também tem um efeito físico, em fraqueza e enfermidade, sim, ela até leva a falecimentos. Mais uma vez fica claro todo o realismo na compreensão paulina da santa ceia [16].

3 – Não discernindo o corpo do Senhor (1Co 11.29c). Paulo está falando de dois corpos aqui. O primeiro corpo é o corpo físico de Cristo. E o corpo que foi moído e traspassado na cruz. Contudo, há outro corpo que precisa ser discernido. E o corpo místico de Cristo. Qual é o corpo místico de Cristo? A Igreja! Quando você vem para a Ceia, mas, despreza o seu irmão, fazendo acepção de pessoas, ou nutrindo mágoa em seu coração, você está participando da Ceia sem discernir o corpo. E se você participa da Ceia sem discernir o corpo, você está participando de forma indigna [17].

Essa palavra de Paulo tem um paralelo com o Salmo 133 que nos diz: “Oh! quão bom e quão suave é que os irmãos vivam em união. É como o óleo precioso sobre a cabeça, que desce sobre a barba, a barba de Arão, e que desce à orla das suas vestes. Como o orvalho de Hermom, e como o que desce sobre os montes de Sião, porque ali o Senhor ordena a bênção e a vida para sempre”.

Sem o discernimento do Corpo de Cristo não pode haver o derramar da graça mediante o Espírito Santo e, logicamente, não pode ter bênção e nem vida. 

3 – COMO DEVEMOS PARTICIPAR DA CEIA (1Co 11.28,33).

Esses versículos nos ensinam verdades fundamentais para participarmos da ceia.

1º - Para participar da ceia deve-se fazer um autoexame (1Co 11.28a). Os que participarão da ceia devem examinar-se a si mesmo. Olhar para dentro de si, vasculhar o seu coração e mente. Werner de Boor diz que a verdadeira – dignidade para a mesa do Senhor Jesus reside unicamente na minha – indignidade real e por mim mesmo confirmada [18]. O texto nos diz para olharmos para nós mesmos e participarmos da ceia, e não olharmos para a vida do irmão ao lado. Tem gente que deixa de participar da ceia porque fica bisbilhotando a vida alheia. Você não é o juiz do seu irmão. Em vez de examinar e julgar a vida alheia; examine-se a si mesmo e julgue-se a si mesmo. Investigue o seu coração. Analise a sua vida.

2º - Depois do autoexame coma do pão e beba do cálice (1Co 11.28b). E digno observar que Paulo diz: Examine-se o homem a si mesmo e coma. Paulo não diz: Examine-se o homem e deixe de comer. Você não deve fugir da Ceia por causa do pecado, mas fugir do pecado por causa da Ceia. A Ceia é um instrumento de restauração. A Ceia é um tempo de cura, de reconciliação e restauração. A Ceia é o momento em que devemos aguçar os sentidos da nossa alma para examinar-nos e nos voltarmos para o Senhor. Na Ceia devemos correr do pecado para Deus e não de Deus para o pecado. A ordem de Paulo é: Examine-se e coma! [19]. Amém?

3º - Esperar uns pelos outros (1Co 11.33). Essa palavra é usada aqui em sentido literal. É como se Paulo tivesse escrito: “Esperai até todos terem chegado, antes de iniciardes a festa”. A Ceia do Senhor tem por propósito fomentar o companheirismo espiritual, não tendo por finalidade principal satisfazer a necessidade que o corpo tem de alimentos. Se porventura algum crente está com fome, pode comer em sua própria casa [20]. Entendendo aqui que a ceia na igreja primitiva era uma festa com muito alimento. Devido a isso Paulo chama a atenção da igreja de Corinto, pois alguns que não tinham o que comer passam fome na ceia (1Co 11.21,22).

4º - Paulo mostra que quando participamos da ceia devemos olhar para quatro direções. Warren Wiersbe destaca quatro pontos que Paulo ensinou sobre a Ceia, e que devemos ainda hoje observar sempre que nos reunirmos para a Ceia do Senhor: devemos olhar para trás, para a frente, para dentro e ao redor [21].

a) Devemos olhar para trás (1Co 11.24,26a). Quando você participa da Ceia, você deve olhar para trás, para a cruz de Cristo (11.26). Jesus está ordenando que a igreja se lembre não dos Seus milagres, mas da Sua morte. Devemos olhar para trás e nos lembrar por que Cristo morreu, como Cristo morreu, por quem Cristo morreu. Cristo é o centro da Ceia. A Ceia é uma pregação dramatizada do calvário [22].

Devemos lembrar o fato de Jesus haver morrido, pois sua morte faz parte da mensagem do evangelho: “Cristo morreu [...] foi sepultado” (1Co 15.3,4). Não é a vida de Cristo nem seus ensinamentos que salvam os pecadores, mas sua morte. Portanto, devemos nos lembrar do motivo dele ter morrido: Cristo morreu por nossos pecados; foi nosso substituto (Is 53.6; 1 Pe 2.24), quitando uma dívida que jamais poderíamos pagar [23].

b) Devemos olhar para a frente (1Co 11.26). Quando participa da Ceia, você não olha somente para trás, mas também para a frente. Paulo diz: “Porque, todas as vezes que comerdes este pão e beberdes o cálice, anunciais a morte do Senhor, até que ele venha” (11.26). A Ceia nos aponta para a segunda vinda de Cristo, quando Ele vier buscar a Sua Igreja.

c) Devemos olhar para dentro (1Co 11.28). Quando você celebra a Ceia, não somente olha para trás e para a frente, mas também olha para dentro. Investigue o seu coração. Analise a sua vida. E digno observar que Paulo diz: Examine-se o homem a si mesmo e coma.

d) Devemos olhar ao redor (1Co 11.33,34). Quando você participa da Ceia, você olha ao redor (11.33,34). Paulo está orientando os crentes a esperarem uns pelos outros para uma verdadeira comunhão. E caso alguém tenha que se reconciliar com algum faça e procure ter paz com todos os irmãos.

CONCLUSÃO

A ceia é algo que vai muito além de comer o pão e beber o cálice. A ceia é nos lembrarmos da morte de Cristo e reconhecermos o que Ele fez por nós na cruz. Não devemos participar da ceia com partidarismo e ódio no coração, mas buscar estar em paz com os nossos irmãos. É fugir do pecado para os braços de Deus.

Pense Nisso!

Bibliografia

1 – Lopes, Hernandes Dias. 1 Coríntios, como resolver conflitos na Igreja, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2008, p. 216.

2 – Morris, Leon. 1 Coríntios, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 3ª ed., 1986, p. 128.

3 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, 1 Coríntios, vol. 4, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2002, p. 180.

4 – Kistemaker, Simon J. Comentário de 1 Coríntios, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 546.

5 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, 1 Coríntios, vol. 4, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2002, p. 180.

6 – Boor, Werner de. Cartas aos Coríntios, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2004, p. 93.

7 – Kistemaker, Simon J. Comentário de 1 Coríntios, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 552.

8 – Calvino, João. 1 Coríntios, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2015, p. 415.

9 – Morris, Leon. 1 Coríntios, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 3ª ed., 1986, p. 131.

10 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, 1 Coríntios, vol. 4, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 183.

11 – Ibidem, p. 183.

12 – Lopes, Hernandes Dias. 1 Coríntios, como resolver conflitos na Igreja, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2008, p. 218.

13 – Prior, David. A Mensagem de 1 Coríntios, Ed. ABU, São Paulo, SP, 1993, p. 202.

14 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, 1 Coríntios, vol. 4, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 185.

15 – Calvino, João. 1 Coríntios, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2015, p. 421.

16 – Boor, Werner de. Cartas aos Coríntios, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2004, p. 95.

17 – Lopes, Hernandes Dias. 1 Coríntios, como resolver conflitos na Igreja, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2008, p. 219.

18 – Boor, Werner de. Cartas aos Coríntios, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2004, p. 94.

19 – Lopes, Hernandes Dias. 1 Coríntios, como resolver conflitos na Igreja, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2008, p. 215.

20 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, 1 Coríntios, vol. 4, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 186.

21 – Wiersbe, Warren W. 1 Coríntios, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 792,793.

22 – Lopes, Hernandes Dias. 1 Coríntios, como resolver conflitos na Igreja, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2008, p. 215.

23 – Wiersbe, Warren W. 1 Coríntios, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 792.

terça-feira, 19 de março de 2024

A CURA DOS DEZ LEPROSOS - Lucas 17.11-19

Por Pr Silas Figueira

Texto base: Lucas 17.11-19

INTRODUÇÃO

“E aconteceu que, indo ele a Jerusalém, passou pelo meio de Samaria e da Galileia” (Lc 17.11). Charles L. Childers destaca que Esta é uma nota editorial usada por Lucas para lembrar os seus leitores de que a viagem para Jerusalém ainda continuava; um fato que o leitor poderia facilmente esquecer em meio ao grande número de feitos e palavras de Jesus que Lucas está relatando. [1] Rienecker também destaca que o fato de o evangelista relatar que Jesus circulara entre a Samaria e a Galileia significa que durante a peregrinação ele se deteve por certo tempo na divisa entre as duas regiões. A passagem por essa área de fronteira torna compreensível que entre os dez leprosos houvesse nove judeus e um samaritano. [2]

Charles H. Spurgeon disse que “a desgraça aglomera muitos companheiros estranhos”, [3] tendo em vista que judeus e samaritanos não se davam bem (conf. Jo 4.9). No entanto, todos eles eram páreas da sociedade, independe de ser judeu ou samaritano. Todos eles dependiam da misericórdia de muitos e eram rejeitados por todos.

William Hendriksen diz que os dez leprosos eram de nacionalidade mista (vs. 16, 18); isso não constitui um fenômeno estranho onde duas províncias se encontram. Além disso, a miséria gosta de companhia, e quando alguém é afetado pela lepra, a nacionalidade deixa de ser uma barreira para a comunhão: os judeus e os samaritanos se unem. [4]

Wiersbe diz que os acontecimentos de João 11 ocorreram entre Lucas 17.10 e 11, enquanto Jesus se dirigia a Jerusalém. Na fronteira entre a Samaria e a Judéia, Jesus curou dez leprosos de uma só vez, milagre ainda mais significativo pelo fato de incluir um samaritano (ver Lc 10.30-37).

 [5] Nessa mesma linha de pensamento, Leon Morris citando Arndt, diz que Jesus foi para uma cidade chamada Efraim depois de ressuscitar Lázaro, (Jo 11.54), sendo que esta cidade fica 32 km ao norte de Jerusalém. Sugere que quando a Páscoa se aproximava, Jesus continuou indo na direção norte para juntar-Se aos peregrinos galileus que subiam a Jerusalém, e que foi naquela época e local que este incidente ocorreu. [6]

Com isso em mente, podemos destacar algumas lições através desse texto. 

1 – PRIMEIRAMENTE DEVEMOS DESTACAR O QUE É LEPRA. 

“Lepra” se referia a várias doenças de pele, as quais hoje já têm outros nomes e tratamentos. A maioria delas era contagiosa por isso os doentes deviam ficar isolados da comunidade e da religião, devido a isso, eles não podiam frequentar nem sinagogas e nem o templo.

O que é a lepra – doença de Hansen. Essa doença é causada pela bactéria Mycobacteruim leprae, descoberto pelo cientista norueguês Gerhard Henrick Armauer Hansen (1841–1912). É uma doença infecciosa crônica causada por um bacilo que gravita nos nervos periféricos e nas áreas mais frescas do corpo. A pele, como a região mais fresca do corpo, é usualmente afetada primeiro e de forma mais relevante pela lepra. As partes afetadas ficam insensíveis e, devido a isso, muitas feridas não são tratadas. Suas condições são discutidas em dois extensos capítulos de Levítico 13 – 14 que parecem um manual antigo de dermatologia. O termo tsaraath cobre outras doenças de pele além da hanseníase, incluindo feridas purulenta (Lv 13.18), queimadura (Lv 13,24), coceira, frieira e problema no couro cabeludo. Naquela época, a lepra abrangia alergias de pele em geral, das quais os rabinos tinham relacionado 72, tanto de curáveis quanto incuráveis. [7]

Sabe-se hoje que a lepra (hanseníase) não é altamente contagiosa, uma vez que 90 a 95 por cento da raça humana está imune a ela. Exatamente como a doença é transmitida não se sabe ao certo, mas as pessoas que vivem em contato próximo com pessoas com hanseníase não tratada tinham um risco maior de se infectar.

2 – ESSES HOMENS CRIAM QUE JESUS PODERIA CURÁ-LOS (Lc 17.12-14).

Matthew Henry lembra que a lepra era uma doença que os judeus supunham ser infligida como castigo por algum pecado específico, e supunham ser, mais do que as outras doenças, uma marca do desprazer de Deus. [8] Embora, houvesse alguns casos no Antigo Testamento em que algumas pessoas ficaram leprosas por causa do pecado cometido. Temos como exemplo o caso de Miriã (Nm 12); Geazi (2Rs 5.25-27); o rei Uzias (2Cr 26.16-23). Esses ocorridos foram consistentes para a crença judaica tradicional que o sofrimento era o julgamento de Deus por causa do pecado (Jo 9.1-3). 

No entanto, esse ocorrido aqui uma demonstração impressionante da bondade divina, de Sua ternura, compaixão e misericórdia, bem como o poder divino de Cristo para curar muitas doenças incuráveis e restaurá-los à saúde integral. Portanto, Cristo, que veio para tirar o pecado, e desviar a ira de Deus, tomou o cuidado especial de curar os leprosos que se aproximaram dEle em seu caminho.

É também uma história de gratidão, adoração e salvação, e, ao mesmo tempo, um conto de ingratidão chocante. É a história não só de dez leprosos que foram curados fisicamente, mas também de um homem que foi curado espiritualmente e eternamente.

Destaquemos algumas lições nesse texto.

Em primeiro lugar, esses leprosos clamam pela misericórdia de Jesus (Lc 17.13). Esses homens clamaram de longe. Champlin destaca que o limite legal de separação entre os leprosos e uma pessoa sã era de cem passos, e é bem provável que tivessem observado esse limite. [9] 

Eles não pedem para ser purificados; clamam apenas por compaixão. Jesus, em resposta, apenas ordena que eles vão e se mostrem aos sacerdotes. Isso era o que a lei exigia. Só os sacerdotes, autoridades sanitárias e inspetoras de saúde, podiam diagnosticar a lepra ou declarar uma pessoa curada da lepra. Jesus não tocou neles como fez com o homem tomado de lepra (Lc 5.12-16), nem mesmo declarou que eles estavam limpos. Apenas os enviou aos sacerdotes. [10]

Em segundo lugar, eles obedeceram a ordem de Jesus (Lc 17.14). A instrução do Senhor de mostrarem-se aos sacerdotes estava associada a promessa de que ao chegar até os sacerdotes estariam libertos de seu mal. A obediência à ordem recebida confirma a confiança deles na promessa implícita. A execução da instrução do Senhor foi recompensada, pois eles foram purificados tão logo se puseram a caminho dos sacerdotes.

A razão de Jesus falar em “sacerdotes” no plural, talvez seja que judeus e samaritanos tivessem sacerdotes diferentes. Quaisquer samaritanos entre os leprosos se apresentariam aos sacerdotes no monte Gerezim, e os judeus entre eles (caso houvesse algum) se apresentariam aos sacerdotes no templo em Jerusalém. [11] Conforme a lei, um leproso livre de seu sofrimento tinha de apresentar-se ao sacerdote, para que este o declarasse puro, a fim de voltar a ser acolhido na comunhão teocrática do povo.

Devemos entender aqui que a cura para as nossas mazelas espirituais ocorre quando obedecemos a Cristo. Outra coisa, é durante o percurso da nossa caminhada com o Senhor que somos purificados. A salvação é imediata, a santificação é um processo de vida com Deus. À medida que andamos com Deus, o Senhor vai nos purificando de nossos maus hábitos. Vai remodelando o nosso caráter. Mas isso é um processo da caminhada com Ele. Este processo pode ser até imediato, mas, geralmente, é longo e doloroso. Exige renúncia, abnegação, perseverança, liberação de perdão. O crescimento espiritual e a cura da alma são um processo paulatino.

Muitas pessoas querem a cura para suas mazelas, mas poucas pessoas querem obedecer ao que Jesus lhes ordena. Querem a cura, mas não estão dispostas a seguir a orientação de Jesus.

Jesus lhes disse para irem e se apresentarem aos sacerdotes. Seria o mesmo que ir à igreja hoje e se apresentar perante um pastor. Tem gente que vai dizer que assim eles não querem. Que isso é fazer proselitismo. Que para alcançar a cura não é necessário frequentar uma igreja. Que ele já tem a sua religião. Que Deus está em todos os lugares... Essa foi uma ordem simples, que haveria muita relutância hoje.  

 3 – SOMENTE O SAMARITANO VOLTA PARA AGRADECER A CURA ALCANÇADA (Lc 17.15,16).

E um deles... voltou glorificando a Deus (Lc 15,16). Este homem estava plenamente consciente do milagre que lhe foi concedido, e se sentia profundamente grato pela cura. Ele expressou a sua gratidão com grande emoção e em voz alta. E este era samaritano. Isto não era o que um judeu teria esperado de um samaritano. Os discípulos puderam aprender uma lição através desta experiência: a gratidão e a bondade são o resultado do caráter de cada pessoa; estas qualidades não estão ligadas à raça e nem à nacionalidade. [12]

Com isso em mente, podemos destacar algumas lições.

Em primeiro lugar, nem todos são gratos a Deus pelas bênçãos recebidas. Seria de esperar que os dez homens corressem de volta para Jesus, a fim de agradecer a ele por essa nova chance de viver, mas somente um deles voltou... e nem sequer era um dos judeus. Deveriam ter ficado extremamente gratos pela providência de Deus em levar Jesus até aquela região, pelo amor de Jesus que o havia compelido a lhes dar atenção e pela graça e pelo poder de Deus, que realizaram sua cura. Deveriam ter improvisado um coral masculino e, juntos, entoado o Salmo 103! [13] Mas não foi isso o que ocorreu.

Como disse Charles H. Spurgeon: “É triste ver que, sendo Deus inteiramente bondade, o homem é totalmente ingratidão!” [14]

Se diante de um milagre como este somente uma pessoa volta para agradecer, imagine, então, diante dos milagres diários que o Senhor nos proporciona? Das misericórdias de Deus derramadas sobre nós todos os dias? Vida, saúde, visão, audição, amor no lar, as nossas amizades... se diante do milagre da cura da lepra houve um agradecimento de 1 para 9, diante desses outros milagres não há agradecimento. É algo raro também! 

Martin Rinkhart escreveu o hino “Demos graças ao nosso Senhor” durante a Guerra dos Trinta Anos*, num período em que seus deveres como pastor eram extremamente árduos. Numa única semana, chegou a realizar trinta funerais, inclusive o de sua esposa; no entanto, escreveu as palavras tão belas desse hino como uma oração de agradecimento para sua família fazer antes das refeições. Apesar da guerra e da peste negra a seu redor, bem como da tristeza profunda em seu ser, Rinkhart foi capaz de agradecer ao Senhor de coração. [15]

Em segundo lugar, os dez leprosos rogam pela cura, mas somente um deles volta louvando a Deus. A quantidade dos que pedem oração é superiormente maior dos que voltam para louvar a Deus pelas bênçãos alcançadas. Charles H. Spurgeon diz que a oração não é um exercício tão celestial quanto o louvor; a oração é para o tempo, mas o louvor é para a eternidade. [16] Por isso que vemos tantas pessoas pedindo oração, mas poucas louvando a Deus.

Em terceiro lugar, existem muito mais pessoas que creem, dos que voltam para louvar a Deus. Existem pessoas que depositam uma fé inabalável em Deus e em Seu agir em suas vidas; e muitas dessas pessoas alcançam a bênção desejada, no entanto, são poucas pessoas que retornam para louvar a Deus pelo bem alcançado.

Pessoas assim querem as bênçãos de Deus, mas não querem se comprometer com Ele. Querem ser beneficiadas, mas não estão dispostas a deixar a vida de pecado e abraçar uma vida santa que glorifica a Deus. Querem as bênçãos do Senhor, mas não o Senhor da bênção!

Em quarto lugar, existem pessoas que nem diante da morte oram. Qualquer pessoa que estivesse com lepra na época de Jesus estava carregando um atestado de óbito, ainda que estivesse ainda vivo. Um leproso era um morto vivo.

Estes dez leprosos viram a oportunidade de cura, ou, de voltar à vida, e não perderam a oportunidade de rogar pela cura a Jesus. Ainda que o pedido deles fosse por misericórdia. No entanto, como podemos explicar que muitos não oram de maneira alguma? Pergunta John C. Ryle. Que se contentam em repetir fórmulas de oração, mas nunca oram com todo o seu coração? O que podemos dizer sobre homens e mulheres que estão às portas da morte, cujas almas podem se perder ou ser salvas, e que sabem tão pouco da oração genuína, sistemática e de coração? Resta-nos uma resposta curta e simples. A maior parte da humanidade não possui qualquer senso de pecado. [17]

 4 – AS CARACTERÍSTICAS DA VERDADEIRA GRATIDÃO (Lc 17.15-19).

Enquanto os dez iniciavam sua jornada ramo aos sacerdotes, uma corrente de saúde e vigor começou a percorrer cada tecido do corpo deles. Foram completamente curados e tomaram consciência disso. Mas, de repente, um dos dez – somente um – deu meia-volta e voltou a Jesus. [18] Champlin diz que o ex-leproso samaritano, agora curado, porquanto nenhuma bactéria poderia jamais resistir ao poder da palavra de Deus, voltou a Jesus. É bem provável que ele não se tivesse afastado muito de onde se achara, e assim o ex-leproso pôde encontrá-lo com relativa facilidade. [19] A simples ação desse samaritano demonstra o caráter da gratidão de do louvor.

Com isso em mente, podemos destacar algumas lições.

Em primeiro lugar, a verdadeira gratidão é marcada pela individualidade (Lc 17.15a,17). Eram dez os curados, mas somente este homem, e este era samaritano, volta para agradecer. Spurgeon diz que você pode pecar em grupo, ir para o inferno com ele; mas quando obtiver a salvação, chegará a Jesus sozinho. [20] Uma pessoa verdadeiramente grata a Deus, não se deixará influenciar pela frieza das outras pessoas. De imediato, esse samaritano, deixou os nove seguirem o seu caminho, mas retorna para agradecer a Jesus.

Anthony Lee Ash destaca que os leprosos judeus podem ter ficado contentes ao ver o samaritano voltar, desde que a sua doença comum não mais os unia. Do mesmo modo como aconteceu com o bom samaritano (Lc 10.29-37), o comportamento de um estrangeiro envergonhou os judeus, que poderiam ter pensado, como povo escolhido de Deus, que a cura lhes era devida (cf. vs. 7-10). [21]

Os leprosos nove judeus estavam em uma região que, predominantemente, era samaritana, devido a isso, eles se juntaram a esse samaritano, mas quando se viram livres da doença, provavelmente, se viram livre do samaritano. Enquanto poderiam desfrutar de algum bem que este homem poderia lhes dar, estavam com ele, mas quando se viram livres do seu mal o deixaram. Hoje, isso continua acontecendo. Tem gente que só está ao nosso lado “enquanto bem servimos”.  

Em segundo lugar, a verdadeira adoração é marcada pela prontidão (Lc 17.15). Observe que este samaritano volta imediatamente. Ele não voltou depois que se apresentou aos sacerdotes. Ele não deixou para o dia seguinte. Para outra ocasião. Se deixasse para agradecer depois, talvez não encontrasse mais Jesus. Ele voltou enquanto era tempo. Uma coisa é certa: “quem não agradece imediatamente, não agradecerá depois”.

Em terceiro lugar, a verdadeira adoração é marcada pela espiritualidade (Lc 17.15,16). Este samaritano quando viu que estava curado voltou glorificando a Deus. Ele reconheceu a misericórdia de Deus sobre sua vida. Antes de se apresentar aos sacerdotes, ele se apresenta ao Sumo Sacerdote Jesus. Ele caiu com o rosto aos pés de Jesus em adoração. Essa foi uma afirmação da divindade de Cristo. Desde o Antigo Testamento foi ensinado que só Deus deve ser adorado (Êx 20.3-5; 34.14; Dt 5.7-9), mas esse samaritano reconhece a divindade de Jesus. James R. Edwards destaca que a glorificação e reverência caracteristicamente prestadas a Deus aqui são prestadas a Jesus __ e por um não israelita que era um leproso, estrangeiro e samaritano. [22] 

Em quarto lugar, a verdadeira adoração é marcada pela intensidade (Lc 17.15c). Este indivíduo volta à Cristo aos gritos de louvor. Se este homem era tradicional, virou um pentecostal na hora da cura. Se antes era a voz de dez leprosos gritando por misericórdia, agora, era voz de um único homem louvando a Deus pela cura. E, provavelmente, gritando muito mais alto que antes, junto dos outros nove.

5 – A BÊNÇÃO MAIOR ALCANÇADA (Lc 17.16-19).

Até este ponto, os dez homens tinham agido em uníssono. Todos tinham implorado a Jesus para curá-los; todos tinham obedecido Sua ordem e começaram seu caminho para se encontrarem com os sacerdotes; no percurso todos ficaram curados. Nesse ponto, a uniformidade foi quebrada quando um deles, cheio de alegria, espanto, admiração, quando viu que havia sido curado, voltou em direção a Jesus.

Exatamente aqui há uma linha divisória entre receber uma bênção de Deus e alcançar a bênção plena de Deus.

Com isso em mente, podemos destacar duas coisas.

Em primeiro lugar, Jesus censura os outros nove por não terem voltado também (Lc 17.16-18). Observe a pergunta de Jesus: “Não foram dez os limpos? E onde estão os nove? Não houve quem voltasse para dar glória a Deus senão este estrangeiro? Diante da pergunta de Jesus, o pobre homem curado, diante dos seus pés, não tem palavras para dizer contra os nove, por estar demasiadamente ocupado com a adoração pessoal. [23]

A pergunta de Jesus constitui um resumo de um dos mais importantes temas de Lucas-Atos. Foram os samaritanos, os gentios, os párias da sociedade e pecadores que reagiram entusiasticamente à oferta das Boas Novas. Diferentemente dos religiosos e dos orgulhosos, que presumiam que sua piedade lhes garantia a salvação, os desprezados e pecadores nunca presumem que já estão salvos (v. 18:9-14) e ansiosamente aceitam o convite gracioso de Deus (v. 14:15-24). [24]

Em segundo lugar, por ter voltado, o samaritano alcança a bênção suprema da salvação (Lc 17.19). Nove homens contentaram-se apenas com a cura física e seguiram seu caminho. Apenas um voltou para agradecer e, ao voltar, recebeu a maior de todas as curas, a cura espiritual. Jesus lhe disse: Vai, a tua fé te salvou. A cura é uma bênção temporal, mas a salvação é uma bênção eterna. [25]

Fritz Rienecker diz que ao se prostrar diante do Redentor, o samaritano entregou-se como oferta de gratidão: sou teu, quero que disponhas de mim. Jesus lhe assegura: “Tua fé te salvou”. [26] Champlin também destaca que diferentemente dos outros nove ex-leprosos, esse homem não foi curado apenas fisicamente. Sua alma também foi curada. Recebeu purificação espiritual, e ficou realmente são em toda a sua personalidade. [27]

David Neale ressalta o fato de só o samaritano sair daquele encontro curado pela fé. Os excluídos são convidados a entrar, enquanto os incluídos falham em demonstrar gratidão. [28] Warren Wiersbe é oportuno quando escreve: “Os nove amigos do samaritano foram declarados cerimonialmente puros pelo sacerdote, mas ele foi declarado salvo pelo Filho de Deus”. [29]

 CONCLUSÃ

Esse texto é uma lição para todos nós. Sermos gratos a Deus pelas bênçãos recebidas, pois, independentemente da bênção, ela é um milagre em nossas vidas. Seja a cura de um mal incurável, seja o pão de cada dia. Seja grato.

Vivemos um período em que a ingratidão faz tem se tornado algo corriqueiro. Poucos são capazes de reconhecer o que o próximo fez de bom, e serem gratos por isso. Não são gratos aos pais, não são gratos aos amigos, não são gratos a Deus.

Não são gratos, mas são extremamente ingratos. Muitos são até muito religiosos como os nove ex-leprosos que compareceram perante os sacerdotes, mas não são capazes de retornarem à presença de Jesus e o adorar e agradecer.

Pense nisso!

Nota – *A Guerra dos Trinta Anos representou um conjunto de conflitos, de caráter político e religioso, desenvolvidos entre diversos países da Europa (França, Inglaterra, Espanha, Portugal, Alemanha, Dinamarca, Países Baixos, Áustria, Suécia), durante os anos de 1618 e 1648.

Bibliografia:

1 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 463.

2 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 355.

3 – Spurgeon, Charles H. Os Milagres de Jesus, Ed. Shedd, São Paulo, SP, 2011, p. 110.

4 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 334.

5 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 317.

6 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 242.

7 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Santo Amaro, SP, Ed. Sheed, 2019, p. 222.  

8 – Henry, Matthew. Comentário Bíblico Novo Testamento Mateus a João, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2008, p. 673.

9 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 167.

10 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 498.

11 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Sto Amaro, SP, 2019, p. 612.

12 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 463.

13 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 317.

14 – Spurgeon, Charles H. Os Milagres de Jesus, Ed. Shedd, São Paulo, SP, 2011, p. 110.

15 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 317.

16 – Spurgeon, Charles H. Os Milagres de Jesus, Ed. Shedd, São Paulo, SP, 2011, p. 111.

17 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 280.

18 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 355.

19 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 168.

20 – Spurgeon, Charles H. Os Milagres de Jesus, Ed. Shedd, São Paulo, SP, 2011, p. 113.

21 – Ash, Anthony Lee. O Evangelho Segundo Lucas, Ed. Vida Cristã, São Paulo, SP, 1980, p. 255.

22 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Santo Amaro, SP, Ed. Sheed, 2019, p. 614.

23 – Spurgeon, Charles H. Os Milagres de Jesus, Ed. Shedd, São Paulo, SP, 2011, p. 115.

24 – Evans, Craig A. O Novo Comentário Bíblico Contemporâneo, Lucas, Ed. Vida, São Paulo, SP, 1996, p. 292.

25 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 500.

26 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 357.

27 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 168.

28 – Neale, David A. Lucas, 9 – 24, Novo Comentário Beacon, Ed. Central Gospel, Rio de Janeiro, RJ, 2015, p. 198.

29 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 318. 

segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

CARACTERÍSTICAS DE UM VERDADEIRO CRISTÃO - Lucas 17.1-10

Por Pr Silas Figueira

Texto base: Lucas 17.1-10

INTRODUÇÃO

A estrutura da narrativa para esse capítulo continua sendo a viagem para Jerusalém: “A caminho de Jerusalém, Jesus passou pela divisa entre Samaria e Galileia” (Lc 17.11). [1] Jesus entra em Samaria em Lc 9.51 e termina esse percurso com a entrada triunfal em Jerusalém (Lc 19.28ss). Como disse Eugene Peterson: “É ao viajar por Samaria, indo da Galileia para Jerusalém, que Jesus separa um tempo para contar histórias que preparam seus seguidores a trazer o comum da vida a uma percepção consciente e uma participação nessa vida do reino” [2]

Jesus tinha alertado aos seus discípulos a respeito do inferno, contando a parábola do rico e Lázaro, mostrando que, uma vez nesse lugar terrível, é impossível escapar (16.26-31). Agora, à medida que Jesus está com os discípulos, e dialogando com eles, o Senhor lhes traz três ensinamentos extremamente importantes a todos nós.

Vejamos esses ensinamentos.

UM VERDADEIRO CRISTÃO NÃO PODE SER PEDRA DE TROPEÇO PARA OS OUTROS (LC 17.1,2).

Jesus disse aos discípulos, não apenas aos doze discípulos, mas ao seu círculo mais amplo de seguidores. O assunto em questão tem uma grande aplicabilidade, mas tem uma relevância especial ao cristão que precisa de orientação em seu relacionamento e responsabilidade pelos seus semelhantes. [3]

Jesus nos traz três advertências em relação aos escândalos ou pedra de tropeço, como pode ser também traduzido.

Em primeiro lugar, a inevitabilidade dos escândalos (Lc 17.1). Na versão ACF diz que é “impossível” que não venham escândalos. Inevitável, impossível (Anendektos em grego), aparece somente aqui no Novo Testamento. [4]

E por que que é impossível que venham os escândalos? Porque vivemos em um mundo que jaz no maligno. Em um mundo corrupto. Um mundo imperfeito e caído.

Mas tem uma segunda pergunta que precisa ser respondida. Por quem vem os escândalos? Eles vêm dos religiosos. Os escândalos não vêm do mundo. Eles nascem dentro da igreja, no meio dos que se dizem cristãos. E, infelizmente, temos muitos exemplos atualmente. As redes sociais nos mostram todos os dias um novo escândalo em nosso meio.

Mas há uma terceira pergunta. O que é o “escândalo” que Jesus falou? A palavra grega scandala, traduzida aqui por “escândalos”, significa literalmente a lingueta de um alçapão que o faz fechar-se sobre a vítima. [5] Trata-se de um laço, uma armadilha, um tropeço colocado no caminho de alguém. Literalmente uma “pedra de tropeço”.

John C. Ryle diz que há os que professam ser crentes, mas fazem outros tropeçarem sempre que trazem descrédito ao seu cristianismo, por meio de sua inconsistência em palavras, temperamento e conduta. Nós o fazemos sempre que tomamos nosso cristianismo desagradável aos olhos do mundo, por nos comportarmos não de acordo com aquilo que professamos ser. O mundo talvez não entenda as doutrinas e os princípios dos crentes, mas está de olhos atentos àquilo que eles praticam. [6]

Em segundo lugar, a malignidade dos escândalos (Lc 17.1b). David A. Neale diz que a exclamação ouai (ai) nunca é usada para os que estão no aprisco em Lucas, somente aos que estão de fora. Ela é usada para os ricos, para os bem-alimentados e para os falsos profetas (Lc 6.24-26). Ela é usada para Corazim (Lc 10.13) e para os fariseus e advogados seis vezes (Lc 11.42-52). Ela também é usada uma vez para o traidor de Jesus (Lc 22.22). [7]

Essa expressão é usada deliberadamente para aquelas pessoas que aparentam ser uma coisa, mas na verdade são outras. Jesus está aqui alertando os seus discípulos para tomarem cuidado para não caírem no mesmo erro dos fariseus.

Wiersbe diz que afinal, somos todos pecadores, vivendo em um mundo pecaminoso. Mas devemos atentar para não ser motivo de tropeço para outros, pois é algo extremamente sério pecar contra outro cristão e tentá-lo ao pecado (Rm 14.13; 1Co 10.32; 1Jo 2.10). [8]

Em terceiro lugar, haverá uma severa punição aos que trazem escândalos (Lc 17.2). Jesus não nos diz qual será o destino de tal pessoa. O “ai” do versículo anterior mostra que não será agradável, e agora ficamos sabendo que seria melhor para ela ser afogada aqui e agora. [9]

William Hendriksen diz que:

A pedra de moinho de que Jesus fala é a pedra superior de duas pedras entre as quais o grão era moído. A referência não é ao moinho manual, mas à pedra muito mais pesada, que é movida por um jumento. No meio da pedra superior há um orifício por meio do qual se pode jogar o grão para que seja moído entre as duas pedras. A presença desse orifício explica a frase “uma pedra de moinho pendurada ao pescoço”. Ser lançado ao mar com uma pedra desse tipo em torno do pescoço, faz com que o afogamento seja duplamente garantido. Note “esses pequeninos”. Quão queridos são eles para o Salvador! [10] 

Os pequeninos que Jesus se referia não são apenas crianças, mas também a cristãos novos na fé aprendendo os caminhos do Senhor (Mt 18.1-6; Lc 10.21). Uma vez que Lucas 17.1-10 faz parte do contexto que começa em Lucas 15.1, pode ser que esses “pequeninos” incluíssem publicanos e pecadores que creram em Jesus Cristo. [11]

Fritz Rienecker diz que o ai proferido por Jesus contra todo aquele por meio do qual vêm os escândalos vale para os discípulos quando ação e omissão, discurso equivocado ou mau exemplo induzem outros a tropeçar. A palavra severa e altamente ponderável da pedra de moinho ilustra a grave culpa e punição para os escândalos. [12]

UM VERDADEIRO CRISTÃO ESTÁ SEMPRE PRONTO A PERDOAR (LC 17.3-6).

A oposição contra o pecado estabelecido no ponto anterior deve ser equilibrada por uma atitude gentil, ou seja, perdoar os pecadores que nos ofenderam. O cristão não deve pecar contra os outros, mas também não deve guardar rancor quando os outros pecarem contra nós (cf. Lc 11.4). Assim como é ruim que os discípulos incitem outros a pecarem, assim também seria ruim se eles não perdoassem quando outros pecam contra eles. [13]

Rienecker lembra que o contrário de “causar escândalo” é amar. Para não ser motivo de tropeço não apenas precisamos deixar de fazer algo, mas também fazer algo. Cumpre amar sem limites. [14] E a forma de demonstrar esse amor sem limites é através de um coração perdoador. Da mesma forma que é um terrível pecado ser uma pedra de tropeço às pessoas que se achegam a Cristo, também é um grave delito não perdoar as pessoas que pecam contra nós. [15]

Com isso em mente, podemos aprender lições preciosas aqui.

Em primeiro lugar, o perdão exige cautela (Lc 17.3a). A posição forte contra o pecado estabelecido no ponto anterior deve ser equilibrada por uma atitude gentil, mediante o perdão para com os pecadores. Cristãos não devem pecar contra os outros, mas eles também não devem guardar rancor quando os outros pecarem contra eles e, principalmente, se lhe pedirem perdão (cf. Lc 11.4).

Precisamos nos acautelar para não sermos arrogantes até mesmo na maneira de lidar com o perdão. A falta de humildade no trato ou a abordagem errada pode agravar o problema e aprofundar a ferida, em vez de trazer cura e libertação. [17]

 Em segundo lugar, o perdão exige o confronto (17.3b). O termo epitimo (grego), “confrontar” usado no texto original de Lucas ordena um punir ou repreender. [18] Mas com a intenção de que essa pessoa caia em si e se arrependa do pecado cometido. Tanto que há um processo para que tal advertência ocorra. Podemos ver esse processo em Mt 18.15-17: 

“Ora, se teu irmão pecar contra ti, vai, e repreende-o entre ti e ele só; se te ouvir, ganhaste a teu irmão; mas, se não te ouvir, leva ainda contigo um ou dois, para que pela boca de duas ou três testemunhas toda a palavra seja confirmada. E, se não as escutar, dize-o à igreja; e, se também não escutar a igreja, considera-o como um gentio e publicano”.

O objetivo desse processo de quatro etapas é enfrentar e restaurar o pecador de modo a proteger a pureza da igreja. O primeiro passo é se opor ao comportamento do irmão pecador em privado. Se ele se recusar a se arrepender, devemos partir para a segunda etapa, que envolve confrontá-lo novamente com nada menos do que duas testemunhas presentes para confirmar sua resposta. Se ele novamente se recusar a se arrepender, o terceiro passo deve ser aplicado, que é informar a igreja, de modo que toda a irmandade possa confrontá-lo e chamá-lo carinhosamente ao arrependimento. O passo final para um pecador impenitente é colocá-lo para fora da igreja; tratá-lo como um dos párias da sociedade judaica, um “gentio e publicano” (cf. 1Co 5. 1-13; 2Co 13.1,2; 2Ts 3.14,15; Tt 3.10,11) ou um incrédulo, que ele demonstra ser.

Leon Morris diz que não podemos ser indiferentes diante do mal, mas isto não significa que guardaremos ressentimentos. Se quem transgrediu se arrepender, o crente deve perdoar-lhe. [19] O processo deve ser o que o Senhor nos orientou: se houver pecado, deve haver repreensão, se houve arrependimento, deve haver o perdão.

Jesus disse que, se o nosso irmão pecar contra nós, devemos repreendê-lo; se ele se arrepender, devemos perdoá-lo. O silêncio, portanto, não é sinônimo de perdão. O tempo não atenua a dor nem cura a ferida. O confronto é o caminho da restauração. Não é sensato adiar a solução de um problema interpessoal. Não devemos subestimar o poder da mágoa. A única maneira de estancar esse fluxo venenoso é pelo confronto que desemboca no arrependimento e no perdão. [20]

Em terceiro lugar, o perdão deve ser sem limites (Lc 17.4). Quando Jesus fala de sete vezes no dia não quer dizer, naturalmente, que uma oitava ofensa não será perdoada (cf. Mt 18.21-22). Está dizendo que o perdão deve ser habitual. [21]

John C. Ryle lembra que existem poucos deveres cristãos sobre os quais o Novo Testamento fala tão frequente e severamente quanto o dever de perdoar ofensas. Ocupa um lugar proeminente na oração do Pai Nosso. A única confissão que fazemos em toda a oração é a de que “perdoamos aos nossos” os que transgridam contra nós. Esse é um teste para verificarmos se nós mesmos fomos perdoados. [22]

Corroborando com esse argumento, James R. Edwards diz que na segunda petição do Pai Nosso: “Perdoa-nos os nossos pecados, pois também perdoamos a todos os que nos devem” (Lc 11.4), os leitores são lembrados que o cristão deve perdoar os outros. [23]

Em quarto lugar, o perdão vem de um coração transformado (Lc 17.5,6). Aparentemente os apóstolos pensam que muita fé é necessária para perdoar assim. Dizem, portanto, aumenta-nos a fé. [24] MacArthur diz que os apóstolos se sentiram insuficientes diante do elevado padrão que Jesus definia para eles [25]

“Aumenta-nos a fé!” – Isso foi uma admissão humilde e honesta de fraqueza da parte deles para o ensinamento de Jesus. Eles não estavam negando que não possuíam fé, mas duvidavam que era suficientemente forte para agir conforme o ensino de Jesus. Tanto que o verbo grego traduzido “aumenta” significa: “adicionar a”, “suplemento”, “desenvolver” ou “crescer”. O que Jesus exigiu neste contexto lhes parecia ser um padrão impossível de ser alcançado. Além de disso, era completamente o contrário do que eles tinham sido ensinados pelos líderes religiosos (Mt 5.43-48).

A crise dos apóstolos é também a nossa crise, porque o perdão não é algo natural, requer força do alto. Nossa natureza caída clama por retaliação e vingança. Porém, recebemos um novo coração, uma nova mente, uma nova vida. Agora, o Espírito de Deus habita em nós e podemos, pela força do Onipotente, exercitar o perdão. Contudo, esse exercício só é possível quando o próprio Senhor aumenta a nossa fé. O que não podemos fazer por nós, podemos fazê-lo pela força que vem do alto. [26]

Wiersbe destaca que os cristãos maduros sabem que o perdão não é uma simples troca de palavras, como duas crianças que brigam e depois pedem desculpas uma para outra sem grandes considerações. O verdadeiro perdão inclui dor; alguém foi ferido, e há um preço a ser pago para que a ferida cicatrize. O amor motiva-nos a perdoar, mas a fé ativa o perdão, de modo que Deus a utilize para trazer bênçãos à vida de seu povo. [27]

Somente através da fé alcançaremos o que é humanamente impossível fazer (Lc 17.6). A resposta de Jesus tira deles o conceito de maior ou menor em termos de fé, para o de uma fé genuína. Se há fé real, então os efeitos se seguirão. [28] À medida que praticamos a fé, ela irá crescer tornando-se, como o grão de mostarda, uma grande árvore. Ou seja, a fé praticada cresce. Desenvolve a ponto de fazer diferença na vida de outras pessoas. Assim como a mostarda se torna árvore e aninha os pássaros, a fé desenvolvida acolhe os que precisam de alento.

Uma pequena fé no grande Deus é capaz de desarraigar árvores robustas, cujas raízes estão entrelaçadas e aprofundadas na terra, e lançá-las ao mar. As raízes da amoreira ficavam na terra durante 600 anos, de modo que a remoção dela seria muito difícil. Portanto, o que Jesus está dizendo é que nada é impossível à fé. A fé genuína pode realizar aquilo que a experiência, a razão e a probabilidade negariam. [29]

Champlin destaca que em Mateus diz “montanha” (Mt 17.20), ao invés de mostarda, como o objeto que poderia ser lançado ao mar, mediante a operação de uma fé poderosa. Jesus não estava convocando os crentes a se tornarem mágicos, conjuradores ou outros tipos de operadores de milagres ou de místicos; pelo contrário, convoca-os para serem heróis da fé, como aqueles que são ilustrados no décimo primeiro capítulo da epístola aos Hebreus. [30]

Corroborando com esse pensamento, Leon Morris diz que Jesus não está sugerindo que Seus seguidores se ocupem de coisas sem razão de ser, tais como transferir uma árvore para o mar. Está dizendo que nada é impossível à fé: “a fé genuína pode realizar aquilo que a experiência, a razão e a probabilidade negariam, se for exercida dentro da vontade de Deus”. [31]

Jesus usa essa ilustração radical para mostrar que, pela fé, podemos fazer coisas humanamente improváveis e impossíveis, como perdoar ilimitadamente. [32] 

UM VERDADEIRO CRISTÃO NÃO BUSCA RECONHECIMENTO (Lc 17.7-10). 

Muitas vezes alegou-se que essa parábola não tem nenhuma relação com o texto anterior. No entanto, uma apreciação minuciosa dos quatro discursos doutrinários do Senhor revela que essa parábola forma uma boa conclusão do todo. [33]

Champlin lembra que Jesus extraía seu material ilustrativo da vida diária na Palestina, tencionando mostrar como o elemento do dever, no serviço cristão, precisa ser reconhecido; e também que o melhor serviço, prestado segundo os ditames do dever, não pode ser considerado como uma grande demonstração da grandeza do próprio servo. [34]

Com isso em mente, podemos tirar algumas lições aqui.

Em primeiro lugar, o perigo do orgulho espiritual (Lc 17.7-9). A intenção de Jesus é mostrar a necessidade de sermos pessoas perdoadoras, cheias de fé, a ponto de não guardarmos mágoas, mantendo puro o coração; mas nos alerta para o perigo que tudo isso pode levar: “orgulho espiritual”. Alguém já disse certa feita: “Tem gente que é tão humilde, mas tão humilde, que tem orgulho de ser humilde”. Corremos o risco de cairmos nesta armadilha.   

A parábola lembra os ouvintes de Jesus de que não é porque o servo trabalha o dia inteiro no campo que terá o direito de comer antes do Mestre. Ainda é parte da sua tarefa servir a refeição do Mestre no final do dia, antes que se sirva. Ele é um servo e, como tal, não tem direitos. Ele pertence ao seu senhor, e as suas tarefas foram determinadas pelo seu senhor. Quando ele as tiver cumprido, terá feito apenas o seu trabalho; o mérito só existirá quando o servo fizer mais do que aquilo que era a sua obrigação. [35]

 Os escribas e fariseus que eram obcecados por serem homenageados. Em Mateus 23.5-7 Jesus disse-lhes: “fazem todas as obras a fim de serem vistos pelos homens; pois trazem largos filactérios, e alargam as franjas das suas vestes, e amam os primeiros lugares nas ceias e as primeiras cadeiras nas sinagogas, e as saudações nas praças, e o serem chamados pelos homens; Rabi, Rabi” (cf. Lc 20.46,47).

John C. Ryle disse que Jesus deu um poderoso golpe em nossa justiça própria.

Naturalmente, todos nós somos orgulhosos e cheios de justiça própria. Pensamos de maneira elevada a respeito de nós mesmos, de nossos merecimentos e de nosso caráter, mais do que realmente temos o direito de fazê-lo. Esta é uma doença sutil que se manifesta de muitas maneiras diferentes. Muitos podem detectá-la nas outras pessoas; poucos admitirão sua presença em si mesmos. [36]

Jesus contou esta parábola como uma advertência contra o orgulho espiritual, para que não nos esqueçamos de que tudo o que temos e fazemos é somente pela graça de Deus.

Em segundo lugar, a cura do orgulho espiritual é a humildade (Lc 17.10). Como seus servos, devemos ter cuidado para não ter uma atitude incorreta com respeito a nossas obrigações. Há dois extremos a evitar: o primeiro é simplesmente cumprir o dever, como escravos que trabalham só por obrigação; o segundo é cumprir o dever por esperar alguma recompensa. [37] Concordo com Leon Morris quando disse que nosso melhor serviço não nos dá qualquer direito sobre Deus (cf. 1Co 9.16). Na melhor das hipóteses, fizemos apenas o que devíamos fazer. [38]

A frase final da parábola: “Somos servos inúteis, porque fizemos somente o que devíamos fazer” esmaga toda a suposição de mérito pelo agir do servo. Cumpre notar que não é Jesus ou o Senhor na parábola que avalia os servos como servos inúteis, mas que essas palavras representam um testemunho dos próprios servos a respeito de si mesmos. Ainda que de resto Jesus chame seus discípulos “amigos” (Jo 15.14s), eles não obstante permanecem na humilde posição de servo diante de seu Senhor. [39]

Em terceiro lugar, a cura do orgulho espiritual e a gratidão. Devemos servir ao Senhor que deu sua vida pelos servos, ao Senhor que serve a seus servos e lava os pés dos seus servos, que se fez servo e o menor dos servos, para dar sua vida pelos servos. Devemos servir a Cristo não com a mentalidade de escravo, apenas com o senso de dever, mas com profunda gratidão e amor. [40] Fritz Rienecker diz que a ideia básica desta parábola é que todo recurso, toda confiança e todo apoio na realização própria são condenados. Tudo é pura graça. [41]

Servir ao Senhor deve ser um deleite, e não uma obrigação pesada. O cristão deve dizer como Davi: “Agrada-me fazer a tua vontade, ó Deus meu...” (Sl 40.8). 

CONCLUSÃO

Vimos nesse texto três características básicas de um servo de Cristo: ele não é pedra de tropeço na vida das outras pessoas, ele está sempre pronto a perdoar o irmão arrependido e, por fim, ele não busca reconhecimento próprio.

Creio que se colocarmos em prática esses ensinamentos faremos uma grande diferença na igreja, na sociedade, em nós mesmos. Em tempos em que mais se busca é reconhecimento, onde se pratica a retaliação e temos visto tanto escândalos em nosso meio, creio que esses ensinamentos são de extrema importância hoje na igreja.

Pense nisso!

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Bibliografia:

1 – Neale, David A. Lucas, 9 – 24, Novo Comentário Beacon, Ed. Central Gospel, Rio de Janeiro, RJ, 2015, p. 191.

2 – Peterson, Eugene H. A Linguagem de Deus, Ed. Mundo Cristão, São Paulo, SP, 2011, p. 23.

3 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 461

4 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Sto Amaro, SP, 2019, p. 602.

5 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 240.

6 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 275.

7 – Neale, David A. Lucas, 9 – 24, Novo Comentário Beacon, Ed. Central Gospel, Rio de Janeiro, RJ, 2015, p. 192.

8 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 315.

9 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 240.

10 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 350.

11 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 315.

12 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 350.

13 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 350.

14 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 351.

15 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 495.

16 – Ibidem, p. 495.

17 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 351.

18 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 240.

19 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 495.

20 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 241.

21 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 276.

22 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Sto Amaro, SP, 2019, p. 605.

23 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 241.

24 – MacArthur, John. Comentário Bíblico MacArthur, Gênesis a Apocalipse, Ed. Thomas Nelson, Rio de Janeiro, 2019, p. 1276.

25 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 496.

26 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 316.

27 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 241.

28 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 496.

29 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 166.

30 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 241.

31 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 497.

32 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 353.

33 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 166.

34 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 465.

35 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 278.

36 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 316.

37 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 241.

38 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 354.

39 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 498.

40 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 354.